De Assunción a Rio de Janeiro POR JULIÃO BOUVIER
Começaremos amanhã a publicação de um descritivo de viagem do jornalista francez JULIÃO BOUVIER, que ora excursiona pelo sertão de MISSÕES.
A primeira parte desso bello trabalho com o qual brindaremos os nossos leitores, em folhetim ao longo da ultima columna da primeira pagina, se compõe dos seguintes capitulos em hespanhol:
La frontera – Miradas atrás y miradas adelante – EL ESTADO DO PARANÁ – La zanja de Rómulo—Ferro carril interoceánico—Heres the smell, etc.—Las sorpresas del porvenir—El que madruga oye misa y compra carne—EL FUTURO DE BARRACÃO.
De Bela Vista ao Barracão
Ainda há pouco, Julião Bouvier, em belos tópicos descritivos, por estas mesmas colunas, entre muitas verdades cruas, acentuou bem, para a República Argentina, a necessidade de providencias sérias sobre o abandono dessa fronteira.
Não descuidemos também as nossas.
Não somos dos que veem na existência de colônias militares, tais como as possuímos, guarda avançada da Patria, trincheira aos atrevimentos de um inimigo ousado e outras tantas cousas bonitas que por aí se espalham, porque a nossa colônia militar não e um forte, não dispõe de elementos necessários a sua própria defesa—como a de Foz do Iguassú― que os tem―como a de Xapecó―vê-se ainda impedida de agir em momento decisivo pela falta de pessoal que o regulamento marca mas cujo número nunca preenchido.
«Mas, há os colonos para um caso de necessidade urgente...»
Oh!... os colonos! Santo Deus, e nós que quase os esquecemos!... Imperdoável isso...
Sim, os colonos (brasileiros todos, só nas colônias de Xapecó e Chopim e estas de nada servem), são umas dezenas de estrangeiros vindos não se sabe de onde―d’algum escaninho do vicio, dalguma dobra de crime―cujo fito não deixam conhecer; aventureiros audazes sem família, sem pátria, sem crenças e sem ideal algum, que venderão hoje como ontem a própria consciência por qualquer moeda azinhavrada e negra!
Esses são os colonos que o Regulamento manda chamar ás armas em defesa da guarnição ameaçada!
Atiramos uma dúzia de homens, (quando alcança a isso) sem armas, sem munições e muitas vezes sem fardamento para a fronteira, a mais de cem léguas de distância do primeiro ponto regularmente guarnecido e único que lhe pode fornecer elemento de reforço em um caso extremo e depois, nós deixamos adormecer anos sobre anos, um doce sonho de paz, num enlevo de confiança cega que para vergonha nossa o futuro há de lembrar um dia e nos fazer corar num protesto vivo de reprovação justíssima.
Não somos, não queremos ser dos que vão buscar no estabelecimento de colônias militares a única solução ao magno problema de fortificação das linhas de nossas divisas.
Não!
Ha outros meios de fortifical-as, povoal-as, desenvolvel-as e sobretudo fazel-as respeitadas sempre.
Julião Bouvier que lembra um dessas colônias para o Barracão como meio único não só de dar a essa região o desenvolvimento que ela pede e o progresso crescente que há de ter, como também de dota-la de meios de defesa a um ataque futuro, não as conhece em seu funcionamento.
Não conhece, por certo, essa outra fronteira a Oeste, onde o Iguassú já feito grande, vae perder seu nome num baralhar de águas cristalinas outrora lamacentas, turvas, em longa faixa divisória, Paraná adentro, deslizar serenamente entre barrancas altas de três nações distintas.
Não visitou, talvez, essa colônia militar antiga, da qual os anos de existência pôde se cada um contar por uma centena de contos de rs., que a União tem custado, para mantel-a ali com cinco ou seis praças e quatro oficiais si tanto, dando, há longos anos, já, ao estrangeiro―nosso bom amigo―um gostoso e sempre apreciado prato de escárnio e de deboche.
Ou, então, conhece e que a força continue...
...Mas... de lado assumptos de tão alta importância e relevância tanta, que a outras por suposto, importará sanar essas dificuldades todas; vencel-as uma a uma com segurança e tino.
E nós, curvemos novamente o busto para a frente numa atitude resignada e dócil em cima do animal que nos conduz.
Dentro em pouco teremos que romper de novo a grande selva bruta, onde só há claridade embaciada e triste e onde parece que vive eternamente a cantar endechas de dor, uma alma qualquer, grande, extraordinariamente grande, que se perdeu na imensidade das brenhas para prantear em pálidas manhãs de estio, com a voz da «brisa que soluça pelas franças», uma saudade sem fim que atormenta os ermos em meio dessa atmosfera de crepúsculos, de magoas, de tristezas.
Dríadas, talvez―talvez almas foragidas de donzelas infelizes que o Mundo maculou na virgindade―vêm perturbar, com melodia estranha de recordações sentidas, toda essa grande paz em que a Natureza pousa.
Soam pelos âmbitos das grotas, cantam na folhagem verde dos pinheirais, repercutem-se a miúdo no murmúrio doce dos arroios, repetem-se com ruído forte e grande no despenhar das brancas cachoeiras e como se despedaçam e morrem nas azas ferozes de pampeiro infernal que ceifa pela base uma floresta inteira,―ecos de um amor vencido, perturbando a quietude religiosa desses lugares, com harmonias divinais que não se explicam.
Ha sempre aí um doce misticismo que fascina a alma, mais que a pena não descreve e nem o pensamento reproduz.
Julião Bouvier.—Do ilustre jornalista francez, Julião Bouvier, que percorre o Paraná para a feitura de um livro de observações, recebemos hoje, de Boa Vista o seguinte despacho telegráfico:
«Aprovecho llegada estacion telegráfica para saludar, agradecido, ao señor director».
Agradecidos.
O sr. Julião Bouvier, o estudioso viajante que vem de percorrer uma extensa região do sertão sul-americano, atravessando o Paraguay e parte do nosso Estado, em longa e interessante missiva dirigida ao exmo. sr. dr. João Candido, eminente chefe do Estado, exprime mais uma vez seu grande entusiasmo diante do cenário prodigioso do sudoeste paranaense.
Encerrando sua longa narrativa diz o sr. Julião Bouvier:
«Sirvo-me da ocasião para dizer-vos que a zona que venho de atravessar contêm riquezas maravilhosas e que o vosso Veto oposto a pretensão do sr. Manoel Nogueira foi aplaudido como um ato de muito elevado patriotismo, que encheu de esperanças aqueles que vos admiram e em cujo número peço-vos contar-me na qualidade de muito sincero admirador.»
Julião Bouvier. Seguiu hoje para Paranaguá, com destino ao Rio, o ilustre jornalista francez sr. Julião Bouvier, que percorreu todo o nosso Estado, desde a fronteira com o Paraguay, estudando a nossa natureza e civilização.
Grata defesa
O sr. Julião Bouvier continua, pelo Diário da Tarde, a exibir a sua birra contra a administração paulista
O seu artigo de ontem começa assim:
«Algunas personas han querido en las publicaciones que yo hice en su digno periódico, una cierta animosidad en conta del Señor Presidente del Estado de S. Paulo.»
É, pois, o próprio sr. Bouvier, o primeiro a proclamar que os seus artigos têm merecido reprovação.
Orgam que representa o pensamento da situação política dominante no Estado, não pôde a Republica silenciar ante os arremessos desse despeitado touriste, que na sua perambulação pelo vizinho Estado, não teve certamente a sorte de ver coroadas de êxito feliz, as pretensões personalíssimas que o conduziram ás portas do palácio presidencial paulista.
O sr. Bouvier escolheu mal o campo onde contorce a sua má vontade para com o vitorioso estadista que conduz os destinos do Estado de S. Paulo. O Paraná, por muitos títulos, mantem com o vizinho Estado do norte uma verdadeira e sincera tradição amistosa, cuja inalterabilidade não serão certamente as hespanholadas do sr. Julião que conseguirão diminuir junto aos corações amigos dos dois povos irmãos.
E não e só da nossa parte que essa camaradagem se perpetua e manifesta. Viemos de assistir ainda agora a maneira cordial e amiga, pela qual o governo paulista recebeu, de modo inequívoco, antes manifestadamente amistoso e distinto, o representante oficial do povo paranaense, representado por S. Exa. o sr. dr. João Candido Ferreira.
É dura a contingência em que nos vemos, ante a atitude hostil de um hospede nosso, neste legitimo desforço, que lhe damos, nos opondo ao seu injustificável procedimento.
Mas a tanto nos obriga o dever, muito mais elevado, de produzir a defesa, grata aos nosso coração, do egrégio estadista injustamente agredido, precisamente naquilo que representa a sua ação mais digna de louvores, como o e iniludivelmente a sua esforçada, patriótica, lúcida e memorável obra governamental.
E, num tal sentido, o eminente dr. Jorge Tibiriça não precisa desta nossa defesa senão como o apoiamento solidário que nós e grato oferecer ao vultuoso estadista do vizinho Estado que o país inteiro acata e admira, como o propulsor mais enérgico do progresso departamental paulista.
Que pôde saber o sr. Julião dessa administração que maldosa e despeitamente detrata?
Foi-lhe dado, acaso, compreender uma tão brilhante e vitoriosa progressividade e a influência benemérita do vizinho no conseguimento desse invejável estado, tão promissor, da civilização paulista?
De que elementos para isso dispôs, que alta esferas percorreu, para assim arriscar juízos críticos tão temários?
S. Paulo e um exemplo que o país inteiro não somente admira, como ostenta com justos entusiasmos, sempre que é preciso apontar, na civilização brasileira, o grau mais alto da nossa cultura.
A instrução, a higiene, a polícia, a educação técnica, o progresso real, enfim, em todas as suas modalidades, ali estão perfeitamente evidenciados, e de modo tão distinto, que afirmam e comprovam o denodado esforço cívico de seu preclaro governante.
Diz o sr. Bouvier com maldosa inverdade:
«La colonia italiana vive alii miserablemente sufriendo privaciones y angustias, vegetando al sol como un almácigo de seres humanos quemados por la helada.»
Pois essa colônia, ainda agora, pelo seu orgam ilustre, a Fanfulla, faz na grande obra que é um monumento literário―O Brazil e os Italianos, uma verdadeira consagração do governo do dr. Tibiriça e mostra as prosperas condições dos italianos domiciliados em S. Paulo.
Quem fala a verdade? Os interessados diretos, representados por esse grande orgam da colônia italiana, ou o sr. Julião Bouvier que por São Paulo transitou escoteira e rapidamente?
Não percamos tempo na demonstração do que está evidente, e ouçamos está risível hespanholada com o que o viajante paraguayo fecha o seu despautério de ontem:
«Protesto a nombre de la prensa sudamericana.
«Protesto a nombre la humanidad contra la esclavitud a que están sometidos los italianos en Estado de S. Paulo».
Isto e simplesmente tolo e carnavalesco.
Que representa o seu cômico protesto?
É ele eco de respeitável fracção do público?
É um assomo ridículo de despeito pessoal de um commis voyageuer, que é zero na opinião pública, célula, si o é, microscópica, como um invisível grão de pó para a imensa potencialidade das cordilheiras
Seguio hoje para a Foz do Iguasú o jornalista francez sr. Julião Bouvier, que nos enviou delicado cartão de despedida.
Julião Bouvier
O nosso operoso e inteligente colaborador, Sr. Julião Bouvier, seguindo hoje, para a Foz do Iguaçu onde vae ficar residência e donde continuará a remeter-nos os seus belos trabalhos e, despediu-se de nós, nas seguintes frases:
«Señores Redactores de «A Notícia».
Adiós! mis buenos amigos. Traten de expresar en mi lugar los afectuosos recuerdos que de Curityba llevo en mi corazón.
Siempre suyo – Julião Bouvier.
Oeste do Paraná
Gravíssimas as revelações que pelas colunas da «Notícia», tem feito o ilustre escritor touriste sr. Julião Bouvier, a respeito Oeste Paranaense.
Não sabemos o que pensará o governo do Estado a tal respeito; entendemos, porém, que dada a gravidade dos factos apontados, não poderá deixar de mandar abrir rigorosa devassa, para resguarda dos interesses paranaenses e bom renome do governo.
O sr. Bouvier e um observador arguto e digno e não desconhecendo por certo, a responsabilidade que decorre de acusações infundadas, não viria à público, como tem feito, trazer ao conhecimento do governo e povos paranaenses, os factos sumamente graves que têm por teatro o Oeste paranaense, factos para as quais, daqui destas colunas, chamamos atenção dos poderes diretivos do Estado.
«Oeste Paranaense»
Tendo agora chegado ao conhecimento dos abaixo assignados, uma correspondência publicada na «A Noticia» de 16 de Março, assignada por Julião Bouvier, onde deparamos com uma referência a nossas pessoas, dizendo que sub-arrendamos a Domingo Barthe uma área de hervaes entre os rios Guarany e Adelaide, obriga nós a salvaguardar a nossa reputação de homens probos, que até de hoje temos gozado, de vir pela imprensa declarar, ser isto uma calúnia, assim como muitas que dito Bouvier tem escrito a respeito de diversas pessoas.
É verdade que vai para dois anos que requeremos do governo uma área de terras devolutas, por aforamento, para extrair erva-mate que pretendíamos explorar per conta própria, e, de acordo com a lei do terras do Estado, que autoriza tais aforamentos, e de conformidade com contratos de aforamentos anteriormente feitos pelo governo com diversas.
Esso requerimento ficou porém sem despacho até esta data, e não nos convindo a exploração atenta as dificuldades de transporte não se cogitou mais disso.
Vê pois o público que vae grande distância entra o que fica exposto, e o que diz Bouvier, a quem desafiamos provar o contrário.
Guarapuava, 12 de Maio de 1908
Rodolpho Boese
Herculano Virmond.
https://memoria.bn.gov.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=800074&Pesq=bouvier&pagfis=10309
CARTA
Recebemos a seguinte, datada de Missiones, Republica Argentina em 2 de Abril:
Señores Redactores d“A Republica”.—Curityba.—Muy señores míos:
Por correo he recibido varios ejemplares del diario "A Noticia", correspondientes al mes de Febrero del corriente año, en los que encuentro estampados en artículos y cartas que llevan al pie el nombre “Julião Bouvier” una serie de burdos ataques a mi persona.
Si la firma no es un seudónimo, o se trata de un homónimo, no son de extrañar en la personalidad que conozco de ese nombre esa clase de ataques de baja especie, pues de antiguo los ha practicado, y por algo de ello es que le fue aplicada la pena de expulsión en otro país de Sud-América.
Pero no trato de parangonar personalidades con ese firmante, sino que, teniendo el concepto de que “A Noticia” es un diario serio, celoso del bien del país y poseído de la verdadera misión de la prensa, me dirijo a ella en procura de la verdad de esos justos ideales:
De muchos párrafos que contienen opiniones personales del firmante, solo cabe lamentar que seguramente por engaño se haya hecho vehículo de ellos a tan culto diario como "A Noticia".
Pero hay otros que importan manifestaciones de delitos previstos y castigados por las leyes, y que si bien allí, por la práctica forma en que los expone el articulista firmante, no son acusables aun cuando dejan la huella de la calumnia que si no me alcanza en el concepto de los que me conocen, no sucede así entre los extraños que se imaginan fantasmagorías de explotaciones, destrucción de riquezas del país, etc., etc., como lo comprueba el hecho de que “A Noticia” los estampa creyendo de buena fe cumplir con su misión más patriótica.
A esos delitos que se me atribuyen más o menos veladamente, y que se atribuyen a todas las empresas que están en la obra de abrir al progreso esa rica región del Brasil, a esos insidiosos cargos que se dan a la publicidad sin fin práctico por la forma, es a los que me refiero para invitar a A Noticia a tomar para sí y sostener en sus columnas el pedido de que se investigue por las autoridades del Estado la verdad, toda la verdad, que haya al respecto. Con las pruebas que muy seguramente habrá reunido antes de aceptar esas colaboraciones, hay seguramente un buen plantel para que el gobierno disponga una investigación, amplia y segura, que las confirme si son verdad y se aplique al castigo a los culpables.
Así se habrá cumplido con las más justas leyes de equidad, y “A Noticia” habrá hecho por su misión una bella obra: librar al Estado de Paraná de los explotadores que denuncia, o dar la seguridad a sus habitantes alarmados por esas prédicas, de que los hechos denunciados eran falsos.
Invito “A Noticia” a proseguir sin personalismos, y solo en procura del bien y de la verdad, esa campaña de investigaciones, pidiendo día por día al gobierno que Ia lleve a efecto como el medio más práctico de no obstaculizar los primeros y más difíciles pasos en la vía del progreso de las fronteras de ese rico Estado.
Saluda a Vdes. atto. S. S. S.
D. Barthe.